segunda-feira, 25 de julho de 2011

No corpo a corpo com a história


Olhando para trás, o que foi para ti o operaísmo?
Três coisas: um romance de formação intelectual, um episódio da história do movimento operário, uma revolução cultural contra a tradição marxista ortodoxa italiana e não só. Mas, antes de mais nada, uma experiência de pensamento e prática de um grupo de pessoas de extraordinária qualidade humana e políticas, que actuavam na base de um acordo divergente, cimentado por um laço de amizade indissolúvel - qualquer que tenha sido a estrada que cada um de nós percorreu em seguida. Numa palavra, diria que aquela experiência nos deixou um "estilo" inconfundível: desde o modo de escrever, cadenciado como o ritmo da fábrica, ao modo de pensar, fora das normas, numa espécie de "estado de excepção intelectual permanente". Em contacto com a fábrica e com o modelo das lutas operárias surgiu um novo tipo de intelectual, orgânico não com o partido, mas com a classe, e uma nova forma de fazer teoria, não de livro em livro, mas no corpo a corpo com a história, para subverter a ordem das coisas. Uma prática de pensamento político perturbante, irredutível a escolas e tradições, mas que apesar disso fecundou também, posteriormente, inovações disciplinares no campo da filosofia, da sociologia e da historiografia.
 O que era a "rude raça pagã"?
A rude raça pagã era aquela que, em frente aos portões das fábricas, nos tirava os panfletos da mão e perguntava, rindo-se: "O que é isto, dinheiro?". Salário contra lucro, eis o que era a classe. Não o interesse geral, mas um interesse parcial, que desmascarava o universalismo burguês e colocava em crise o conjunto do capital, enquanto relação. "O salário como variável independente" não era um slogan económico, era um slogan político, como se viria a demonstrar em 1969. Mas muito antes do "Outono quente", desde as lutas de 1962, se havia iniciado em Turim a invenção operária de práticas antagonistas na "guerra de posições" quotidiana contra o patrão: as lutas do "gato selvagem", a danificação propositada da produção, a sabotagem da linha de montagem, o uso insubordinado dos tempos de produção do taylorismo. Aprendíamos com isso: a capital, que desejava estender o modelo da fábrica à sociedade, nós respondíamos estendendo o modelo da insubordinação operária à política.
Excerto da entrevista de Mário Tronti a Il Manifesto, por ocasião do relançamento de "Operários e Capital" pela Derive Approdi. Alguns capítulos deste livro (editado em português pela Afrontamento) podem ser lidos em inglês aqui.

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